sábado, 13 de dezembro de 2008

Caixas atrás da porta

De duzentos comentários que poderiam ser feitos nessas frações de segundos, o que melhor se encaixa nessa ocasião é:
A disponibilidade dos tênis mede a freqüência dos passos.

Por mais que possa parecer idiota, é uma possível alusão ao fato de meramente poder espairecer, devanear ou se adoentar. Não mais que isso, Luciano tinha vários calçados enclausurados em pequenas caixas empilhadas atrás da porta do quarto. A segurança dos mesmos eram aquelas caixas coloridas de vermelho-morango, azul-amora, marrom-creme-de-café e preto.
Em nenhum momento, porem, Luciano ficou por mais de duas horas sem um par de seus tênis. Dormia com eles, almoçava com eles. Fisiologicamente falando, claro. Até mesmo porque o mundo é fisiológico demais para que se possa tomar qualquer providência contra.
De qualquer forma, mais uma vez, o telecinésico persistia em andar só, desprovido de companhias que possam lhe acarretar desconforto, pensamentos destruidores sobre possíveis rotinas, lembranças marcadas sobre momentos agonizantes que poderiam derrubar qualquer ser humano ou mamute. Os passos ficariam marcados, uniformes e variados sobre a grama, silvando o estalar das folhas secas de primavera (quase que outono. Existe apenas a diferença de seis meses entre o inicio de um e o inicio de outro, como todos sabemos) que, alias, era a sua maior pré-ocupação daquele momento: estalar as folhas secas.
Os ramos das árvores balançavam sob o sibilo suave do vento, o único ser vivo além de Luciano. Era tudo o que Luciano precisava: algum lugar na qual seus pés não topassem com nenhum outro pé, seja ele feminino, masculino, unhas pintadas ou encravadas. Sua cabeça estava tão lotada de pensamentos alheios que os próprios precisavam se esquivar.
Luciano, mesmo apreciando a leitura do vento sob seus cabelos, merecia um maior descanso. Por isso, se jogou na grama, enfiou a testa na mesma e dormiu.
Acordou em sua cama, sabendo que o sonho nunca se realizaria. Porque era o maior sonho da sua vida. Andar sem topar com nenhum pensamento, seja próprio ou alheio.

E, de duzentos comentários que poderiam ser feitos nessas frações de segundos, o que melhor se encaixa nessa ocasião é:
A disponibilidade dos tênis mede a freqüência dos passos.

Um comentário:

Flávia Dessoldi disse...

Fisiologico demais, é claro.
Um monte de gente cuspindo e cagando para ser um pouco mais Bucowski